Angolanos de bem, residentes em Portugal e comprometidos com o estado actual da Saúde Pública, no país, decidiram reunir-se hoje, em Lisboa, para emprestar serventia intelectual, pertinente no sentido de contribuírem com ideias, sugestões e contribuições. Primeira conclusão: O governo angolano não está preocupado em servir as pessoas mas, antes, em servir-se das pessoas, muitas vezes tratando-as como mercadoria. Restantes conclusões: subscrever a primeira conclusão.
Assim, ciente da nobreza do propósito, realizaram o I Fórum Internacional – O estado da saúde pública: Angola e a Diáspora. O evento realizou-se hoje no anfiteatro da UCCLA – União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa, uma iniciativa do Amplo Movimento de Cidadãos e do Folha 8.
Numa tentativa de dar uma primeira ajuda, William Tonet (Director do Folha 8) avançou com uma doação de 100 dólares, desafiando o Presidente da República, João Lourenço, a ser o segundo doador. Se o Presidente do MPLA e o Titular do Poder Executivo quiserem podem ser o terceiro e o quarto doador…
A saúde, em Angola, é um – do ponto de vista formal – direito consagrado, na Constituição da República de Angola. Artigo 77.º (Saúde e protecção social): “O Estado promove e garante as medidas necessárias para assegurar a todos o direito à assistência médica e sanitária, bem como o direito à assistência na infância, na maternidade, na invalidez, na deficiência, na velhice e em qualquer situação de incapacidade para o trabalho, nos termos da lei”.
O Objecto-Chave do I Fórum Internacional foi analisar, debater e apresentar soluções sobre:
– O estado de saúde pública em Angola? O que pode ser feito para a sua melhoria? Saúde preventiva ou reactiva? Junta médica: ganhos e perdas. As principais epidemias? Como diminuir a actual mortalidade infantil? A importância do respeito pela vida humana. Como vencer ou diminuir a mortalidade, em tempo de pandemia Covid-19.
A Associação dos Doentes Angolanos em Portugal (ADAP) acusa o Governo de Luanda (há 45 anos nas mãos do MPLA) de enxotar os doentes em tratamento em Portugal (que, ao contrário de outros, não podem tratar-se no Dubai) para a situação de sem-abrigo ao retirar-lhes apoio ou obrigar ao seu regresso, que a maioria recusa.
Na sequência do encerramento da junta médica de Angola em Portugal, que aconteceu em Fevereiro, dezenas de doentes regressaram a Angola, mas a maioria optou por permanecer em Portugal, alegando com comprovativos clínicos que precisavam de continuar a receber tratamentos que afirmam não existir no seu país.
Na altura, o Governo angolano afirmou que, antes do fecho desta junta médica encontravam-se em Portugal 385 cidadãos, entre doentes e acompanhantes. O fecho da junta seguiu-se a uma auditoria que avaliou os doentes e terá detectado “vários abusos no uso deste mecanismo”. E, assim, à boa maneira do MPLA, pagam os justos pelos pecadores.
Em Fevereiro regressaram 27 doentes, que se juntaram aos 17 que já tinham optado por voltar, por meios próprios, porque tinham a sua situação de saúde resolvida. Ficaram 47 doentes e 20 acompanhantes, a receber apoio do Estado angolano, com regresso previsto até ao final do ano.
Os outros cerca de 100 doentes que optaram por não regressar ficaram por conta própria e sem o apoio do Estado, nem para o pagamento do quarto na pensão onde ainda vivem, nem para despesas. Continuaram, contudo, a receber tratamento médico, ao abrigo do acordo entre Angola e Portugal na área da saúde.
O presidente da ADAP, Gabriel Tchimuco, disse que os doentes que optaram por ficar em Portugal fizeram-no para sobreviver, pois não têm resposta clínica em Angola. Trata-se, sobretudo, de doentes transplantados ou que realizam hemodiálise, além de casos oncológicos.
Entenda-se que, do ponto de vista do Governo, sendo Angola um país pobre que, contudo, tem no partido que o dirige o maior número de milionários por metro quadrado, não pode cuidar dos seus cidadãos, nomeadamente dos plebeus e dos escravos.
Gabriel Tchimuco, que foi sujeito a um transplante renal em Portugal, foi um dos que regressou a Angola e teve de voltar, pois não encontrou resposta clínica ao nível dos exames e medicamentos.
“Quis saber onde faria os tratamentos, qual o hospital, mas não me conseguiram dar resposta. Beneficiei novamente de uma credencial de Junta. Vim novamente porque tive de dar o peito às balas e ir a Luanda por causa disso”, contou.
Até ao momento, “apenas regressaram três ou quatro dos doentes que foram”, porque as autoridades “tiveram de reconhecer que não há condições para os transplantados renais em Luanda, não só por causa da questão medicamentosa, mas também laboratorial, cirúrgica”, prosseguiu.
Aliás, o Governo tem outras prioridades como sejam – por exemplo – a criação de um inovador sistema para fornecer comida aos mais de 20 milhões de pobres que existem em Angola. Sistema esse muito caro. Tratou-se da criação de um plano universal de “self-service” alimentar baseado no livre acesso dos angolanos famintos a todas as lixeiras…
O presidente da ADAP indicou ainda que, dos doentes que regressaram, morreu um que tinha sido sujeito a uma traqueostomia, bem como uma criança que tinha recebido um transplante de medula. Um outro doente morreu recentemente em Portugal. Provavelmente os familiares tiveram acesso ao emblemático programa de fornecimento gratuito de certidões de óbito.
Gabriel Tchimuco lamenta sobretudo a indecisão das autoridades angolanas que deviam ter definido em que circunstâncias clínicas um doente deve permanecer em Lisboa.
“Deviam fazer um ofício, os doentes em situação y, devem permanecer em Portugal. Eu vim, com uma credencial para um mês, mas há muitas coias para fazer, exames para fazer, não sou o único doente do hospital, há uma lista”, sublinhou.
As preocupações estendem-se aos doentes que, temendo pela própria vida se voltassem a Angola, por alegada falta de resposta médica para as suas patologias crónicas, ficaram por conta própria em Portugal.
“A vida não tem preço. Muitos de nós temos condições em Angola, mas depois temos o problema das condições hospitalares. Ir para Angola é uma eutanásia antecipada”, referiu.
Alguns dos doentes que ficaram por sua conta “têm algum apoio do Estado português, que dá para sobreviver, não dá para viver, mas dá para sobreviver”.
A ajuda também chega de familiares, amigos e da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) e da Igreja Evangélica, que “tem ajudado muito”, sobretudo ao nível da alimentação e, em alguns casos, em apoio no alojamento.
A partilha de quartos por vários doentes também tem sido uma solução adoptada para quem não tem mais meios, mas prefere ficar em Portugal.
Estas preocupações ficaram explanadas numa carta que a ADAP endereçou recentemente ao ministro dos Negócios Estrangeiros português, a quem a associação afirma que está a ponderar requerer um “pedido de protecção subsidiária de abrigo em Portugal ou num Estado da União Europeia”.
Na missiva, os representantes dos doentes angolanos em Portugal acusam o Governo de Angola de colocar “todos os doentes sem abrigo, sem apoio alimentar, transporte e outros meios de necessidades vitais, humanamente imprescindíveis”. Importa, contudo, referir que passar fome às segundas, quartas e sextas e nada ter para comer às terças, quintas e sábados é mesmo o pão nosso de cada dia de milhões de angolanos. Portanto…
“Sendo o direito à saúde universal, reiteramos aqui um pedido de urgente intervenção num quadro de solidariedade humana no domínio da saúde, ou no limite ver-nos-emos forçados a requerer pedido de protecção subsidiária de abrigo em Portugal ou num Estado da União Europeia”, salienta a carta.